“Eu trabalho aqui. Aqui é meu sustento. Desde o dia 8 de fevereiro, praticamente, eu não consigo levar minha vida normal. É muito triste viver uma situação dessa e saber que pode vir a lama e devastar um lugar tão bonito como é hoje”, desabafa Rogério Souza Reis, comerciante, que mora em Barão de Cocais, região Central de Minas Gerais, há mais de 20 anos.

A qualquer momento, o talude norte da mina do Congo Soco pode desabar e causar o rompimento da barragem de rejeitos Sul Superior, tornando a Vale responsável por mais um crime socioambiental. A previsão é que cerca de seis mil moradores ribeirinhos serão atingidos e que a lama pode chegar até o centro comercial da cidade. 

Rogério mora no bairro Vila Regina, às margens do São João, rio que possivelmente será contaminado pela lama caso a barragem se rompa. As casas dele e de seus vizinhos podem ser atingidas em 40 minutos. “Comecei a construir aqui desde o chão. Eu mesmo que fiz a base, a maioria das coisas que estão prontas aqui teve a minha mão. Eu que mexi a massa para os pedreiros. Praticamente quase tudo aqui, as árvores que estão plantadas, foi a gente mesmo que fez. Para mim, aqui é meu lugar”, relata. Segundo Rogério, somente as pessoas acamadas, cadeirantes e algumas com dificuldade de mobilidade foram retiradas de casa e levadas para hotéis.

Em nota, a Vale informa que, desde a identificação da movimentação do talude, vem tomando uma série de medidas necessárias para avisar a população sobre a situação e que, ainda, não existem elementos técnicos para se afirmar que o escorregamento do talude causará a ruptura da barragem Sul Superior. Mesmo assim, a mineradora ressalta que está reforçando o nível de alerta e que a cava e a barragem são monitoradas 24h por dia. No domingo (19), a mineradora paralisou o transporte de carga que passava na Estrada de Ferro Vitória a Minas, nas imediações da mina Gongo Soco. O transporte de passageiros já havia sido paralisado na quinta (16), seguindo determinação da Agência Nacional de Mineração (ANM) como medida de segurança.

Brumadinho

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Barragem de Brumadinho da Assembleia Legislativa de Minas Gerai, realizou, na última segunda (20), uma audiência pública na cidade sobre os impactos do rompimento, que despejou milhões 13 milhões de metros cúbicos de rejeitos tóxicos de mineração.

Moradores de Pires, local atingido pela lama, denunciaram aos deputados que a Vale iniciou uma obra há cerca de um quilômetro da comunidade, onde seria depositado os resíduos da barragem rompida. Essa medida seria para cumprir ordens judiciais de limpeza do rio.

Após cinco meses do maior crime socioambiental do país, ainda são cerca de 30 desaparecidos debaixo da lama e 240 mortos.