Presidente do BC diz que queda de desemprego pode levar a inflação; bancos reduzem estimativas para corte de juros
Vinicius Konchinski
Brasil de Fato | Curitiba (PR) | 07 de maio de 2024 às 07:31
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central inicia nesta terça-feira (7) sua terceira reunião do ano para definir o patamar da taxa básica de juros da economia nacional. A chamada taxa Selic está hoje em 10,75% ao ano, e há consenso de economistas de que ela pode e deve ser reduzida na quarta-feira (8). A dúvida que resta é: quanto?
Desde agosto de 2023, o Copom já cortou a Selic por seis vezes, sempre em 0,5 ponto percentual. Antes disso, a taxa tinha ficado em 13,75% ao ano por cerca de um ano.
Naquela época, a justificativa do comitê para a manutenção da taxa básica de juros nesse patamar era a inflação. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou 2022 – último ano do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) – em 5,79%, acima da meta estabelecida por autoridades monetárias.
Em 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assumiu o governo. A inflação entrou em trajetória de queda e isso abriu espaço para a queda dos juros. Já não havia mais espaço para discursos de Selic alta para contenção do crédito e redução da demanda de pessoas e empresas por compras, o que pressionaria para baixo os preços.
Recentemente, porém, o Copom e o próprio presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto – nomeado por Bolsonaro – têm levantado outra hipótese para um corte menor dos juros: a queda do desemprego.
Segundo Campos Neto, com menos pessoas procurando trabalho, empresas estão tendo dificuldades em contratar. Estão sendo então obrigadas a oferecer salários mais altos. Isso tenderia a elevar os custos de produção e, por fim, os preços, causando inflação.
A solução ventilada por Campos Neto seria reduzir o ritmo de queda dos juros. A economia tenderia a crescer num ritmo menos acelerado, freando também a queda no desemprego. Isso tudo reduziria a demanda por compras e a pressão inflacionária.
O problema é que isso se daria às custas do trabalhador, que agora sequer recuperou os rendimentos pré-pandemia.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em meados de 2020, o trabalhador brasileiro recebia, em média, cerca de R$ 3.210. Esse valor caiu para cerca de R$ 2.750 ao final de 2021. De lá para cá, já subiu mais de 13% e bateu em R$ 3.120. Ainda assim, está aproximadamente 2,8% menor do que há quatro anos.
DISPUTA PELA SELIC
Copom decide juros sob pressão de Campos Neto contra aumento de salários e emprego
Presidente do BC diz que queda de desemprego pode levar a inflação; bancos reduzem estimativas para corte de juros
Vinicius Konchinski
Brasil de Fato | Curitiba (PR) | 07 de maio de 2024 às 07:31
Centrais sindicais manifestam-se contra Campos Neto e por juros menores no país - Foto: Renata Machado /FTM-RS
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central inicia nesta terça-feira (7) sua terceira reunião do ano para definir o patamar da taxa básica de juros da economia nacional. A chamada taxa Selic está hoje em 10,75% ao ano, e há consenso de economistas de que ela pode e deve ser reduzida na quarta-feira (8). A dúvida que resta é: quanto?
Desde agosto de 2023, o Copom já cortou a Selic por seis vezes, sempre em 0,5 ponto percentual. Antes disso, a taxa tinha ficado em 13,75% ao ano por cerca de um ano.
Naquela época, a justificativa do comitê para a manutenção da taxa básica de juros nesse patamar era a inflação. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou 2022 – último ano do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) – em 5,79%, acima da meta estabelecida por autoridades monetárias.
Em 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assumiu o governo. A inflação entrou em trajetória de queda e isso abriu espaço para a queda dos juros. Já não havia mais espaço para discursos de Selic alta para contenção do crédito e redução da demanda de pessoas e empresas por compras, o que pressionaria para baixo os preços.
Recentemente, porém, o Copom e o próprio presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto – nomeado por Bolsonaro – têm levantado outra hipótese para um corte menor dos juros: a queda do desemprego.
Segundo Campos Neto, com menos pessoas procurando trabalho, empresas estão tendo dificuldades em contratar. Estão sendo então obrigadas a oferecer salários mais altos. Isso tenderia a elevar os custos de produção e, por fim, os preços, causando inflação.
A solução ventilada por Campos Neto seria reduzir o ritmo de queda dos juros. A economia tenderia a crescer num ritmo menos acelerado, freando também a queda no desemprego. Isso tudo reduziria a demanda por compras e a pressão inflacionária.
O problema é que isso se daria às custas do trabalhador, que agora sequer recuperou os rendimentos pré-pandemia.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em meados de 2020, o trabalhador brasileiro recebia, em média, cerca de R$ 3.210. Esse valor caiu para cerca de R$ 2.750 ao final de 2021. De lá para cá, já subiu mais de 13% e bateu em R$ 3.120. Ainda assim, está aproximadamente 2,8% menor do que há quatro anos.
Dados do IBGE indicam recuperação parcial da renda do trabalhador brasileiro / Reprodução/IBGE
O que é Selic?
A taxa Selic é referência para a economia nacional. É também o principal instrumento disponível para o BC controlar a inflação no país.
Quando ela sobe, empréstimos e financiamentos tendem a ficar mais caros. Isso desincentiva compras e investimentos, o que contém a inflação. Em compensação, o crescimento econômico tende a ser prejudicado.
Já quando a Selic cai, os juros cobrados de consumidores e empresas ficam menores. Há mais gente comprando e investindo. A economia cresce, criando empregos e favorecendo aumentos de salários. Os preços, por sua vez, tendem a aumentar por conta da demanda.
Desde que assumiu o governo, o presidente Lula defende uma redução da Selic. Para ele, caso ela passe a cair de forma mais lenta, Campos Neto poderia ser culpado por um crescimento menor.
Inflação
André Roncaglia, economista e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), não vê motivos para um corte da Selic menor do que 0,5 ponto percentual. "A economia brasileira está crescendo, a taxa de desemprego voltou a crescer [no início do ano] e a inflação está em queda", enumerou ele.
Nesta segunda-feira (6), aliás, o Banco Central divulgou mais uma edição do Boletim Focus. Nela, as previsão de economistas ligados a bancos para a inflação e crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) passaram a ser ainda mais otimistas.
Esses economistas estimam que o IPCA feche o ano em 3,71%. Há quatro semanas, a previsão era de 3,76%. No começo de 2024, era de 3,90%.
A estimativa para 2024 está dentro do intervalo da meta de inflação definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). A meta é de 3% para este ano, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo. Ou seja, até 4,5%.
Já a previsão mais atual dos economistas para o crescimento é de 2,05%. Há quatro semanas, era 1,90%. No início do ano, eles estimavam um crescimento de 1,52%.
O governo federal estima que a economia nacional cresça 2,2% em 2024.
Bancos sinalizam
Apesar de todos esses dados, os economistas do bancos já apostam num corte de 0,25 na quarta-feira. Isso também está no Boletim Focus.
Eles também elevaram mais uma vez sua expectativa para o patamar da Selic ao final deste ano. A previsão mais atual deles é que a taxa feche 2024 em 9,63% ao ano. Quatro semanas atrás, eles previam que essa mesma taxa estivesse em 9% ao ano.
Segundo Róber Iturriet Ávila, economista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a simples mudança nas previsões dos bancos tende a influenciar o corte de juros do Copom.
"O Boletim Focus é levado em conta na decisão do Copom, porque o Copom se baseia muito nas expectativas", explicou.
Para Weslley Cantelmo, economista e presidente do Instituto Economias e Planejamento, a visão dos bancos está ligada à forma ideológica como eles analisam a economia. Ele ratificou que os dados reforçam que há espaço para um corte de 0,5 ponto.
"Os bancos vão criando um ambiente na opinião pública e isso legitima a decisão do Copom [por um corte menor]", afirmou. "O governo, por sua vez, vem reforçando que não aceitaria nenhuma redução menor do que a praticada nos últimos meses."
Edição: Nicolau Soares